Partidas e opostos
Perdemos o afeto que tínhamos conquistado, retrucou Marcos, impaciente na beira do cais. De certo, não enxergará novamente o rosto de Rosa, pensou Camila ao escutar aquela bomba. Mesmo se aquilo fosse somente um desabafo, a vida do dois já estaria sofrendo mudanças. Primeiro porque Marcos foi incisivo na sua colocação. Segundo, por Rosa ter acabado de partir naquele navio rumo `a África.
E eu estava lá, para ajudar e também me despedir. O que aconteceu com minha irmã nesses últimos meses nem eu saberia explicar. Com quase vinte e sete anos na cara, solteira, não poderia imaginar o que passava com minha irmã Rosa. De quieta e estudiosa, transformou-se num barril de pólvora, totalmente antagônica a tudo que um dia foi. E eu a caçula imitava seus passos desde criancinha. Quando ela era punk, eu fui também. Era engraçado como meus colegas me viam chegar na escola. Ou era cabelo arrepiado e pintado, ou senão cheio de miçangas, colares e cabelão. Todos os anos era uma alegria só.
Muitas me copiavam. Mas quando fui crescendo, fui me adaptando ao que realmente queria ser. Uma mulher livre, sedutora e de bem com tudo e com todos. Enquanto isso Rosa foi se adaptando perto de alguma coisa entre dondoca e atleta. Uma mistura de bem estar com certas frivolidades. Claro também, apos se afundar nas drogas, nos psicotrópicos e amalucar junto com a turma da faculdade, era mais que provável que procurasse a igreja evangélica como maior salvação. Mas assentou a vida ao conhecer Marcos numas dessas festas hardcore.
Era a primeira dele e a enésima dela. Ele, meio de lado, observando a todos e ela, no meio de todos, observando não faço idéia, depois de tanto álcool e drogas. No que ela foi caminhando sozinha para o banheiro. Isso é Marcos que conta. Tropeçou em Marcos , que a segurou firme e a levou ao banheiro. Do banheiro para o carro e do carro, para a sua casa.
Rosa acordou tarde naquele domingo. O sol batia fraco na janela cheio de adesivos. Ela se revirou e viu uma bateria vermelha reluzente e vários livros. Estava confusa e com gosto amargo na boca. Levantou subitamente e viu num pôster do Pink Floyd pregado na porta do quarto. Logo pensou que tinha sido seqüestrada. Mas não, viu Marcos parado na porta, com uma garrafa de água. Estendeu a ela, que bebeu meio desconfiada. Soltou um “meu”, do tipo o que faço aqui? Mas não tinha jeito, Marcos já a abordava com centenas de perguntas. É isso que Rosa conta. Na verdade, é isso o que ela contou. De uns dias para cá, seu relacionamento com Marcos foi se esvaecendo até ela tomar a decisão súbita de se mandar. Acho que foi aqueles romances tórridos que chegam em nossas vidas, fulminantes como um furacão, que te devastam internamente, te deixam sem chão. Entopem seus pensamentos com fantasias harmoniosas que tendem a curar qualquer sentimento de fracasso que você possa um dia ter.
Eu, quieta, no começo dos vinte, ainda aguardo uma oportunidade, de sentir isso e por poucos instantes deixar de ser aquela garota segura, para me entregar totalmente a um desejo inesperado de rebeldia, inconseqüência e total falta de pudor. Talvez seja a oportunidade para um dia olhar no horizonte e falar para mim: - Eu já sofri disso e não quero novamente.
E eu estava lá, para ajudar e também me despedir. O que aconteceu com minha irmã nesses últimos meses nem eu saberia explicar. Com quase vinte e sete anos na cara, solteira, não poderia imaginar o que passava com minha irmã Rosa. De quieta e estudiosa, transformou-se num barril de pólvora, totalmente antagônica a tudo que um dia foi. E eu a caçula imitava seus passos desde criancinha. Quando ela era punk, eu fui também. Era engraçado como meus colegas me viam chegar na escola. Ou era cabelo arrepiado e pintado, ou senão cheio de miçangas, colares e cabelão. Todos os anos era uma alegria só.
Muitas me copiavam. Mas quando fui crescendo, fui me adaptando ao que realmente queria ser. Uma mulher livre, sedutora e de bem com tudo e com todos. Enquanto isso Rosa foi se adaptando perto de alguma coisa entre dondoca e atleta. Uma mistura de bem estar com certas frivolidades. Claro também, apos se afundar nas drogas, nos psicotrópicos e amalucar junto com a turma da faculdade, era mais que provável que procurasse a igreja evangélica como maior salvação. Mas assentou a vida ao conhecer Marcos numas dessas festas hardcore.
Era a primeira dele e a enésima dela. Ele, meio de lado, observando a todos e ela, no meio de todos, observando não faço idéia, depois de tanto álcool e drogas. No que ela foi caminhando sozinha para o banheiro. Isso é Marcos que conta. Tropeçou em Marcos , que a segurou firme e a levou ao banheiro. Do banheiro para o carro e do carro, para a sua casa.
Rosa acordou tarde naquele domingo. O sol batia fraco na janela cheio de adesivos. Ela se revirou e viu uma bateria vermelha reluzente e vários livros. Estava confusa e com gosto amargo na boca. Levantou subitamente e viu num pôster do Pink Floyd pregado na porta do quarto. Logo pensou que tinha sido seqüestrada. Mas não, viu Marcos parado na porta, com uma garrafa de água. Estendeu a ela, que bebeu meio desconfiada. Soltou um “meu”, do tipo o que faço aqui? Mas não tinha jeito, Marcos já a abordava com centenas de perguntas. É isso que Rosa conta. Na verdade, é isso o que ela contou. De uns dias para cá, seu relacionamento com Marcos foi se esvaecendo até ela tomar a decisão súbita de se mandar. Acho que foi aqueles romances tórridos que chegam em nossas vidas, fulminantes como um furacão, que te devastam internamente, te deixam sem chão. Entopem seus pensamentos com fantasias harmoniosas que tendem a curar qualquer sentimento de fracasso que você possa um dia ter.
Eu, quieta, no começo dos vinte, ainda aguardo uma oportunidade, de sentir isso e por poucos instantes deixar de ser aquela garota segura, para me entregar totalmente a um desejo inesperado de rebeldia, inconseqüência e total falta de pudor. Talvez seja a oportunidade para um dia olhar no horizonte e falar para mim: - Eu já sofri disso e não quero novamente.
Marcadores: conto
2 Comments:
Adorei este texto, Bruno! Muito bom. Beijos.
Menino, tanto a dizer aqui.
Penso ser este um dos teus textos mais belos.
Tua narrativa na voz de uma mulher assumi uma dimensão de sensibilidade aflorada e inusitada.
Eu gosto muito d a imagem clara do triângulo desde do início. Gosto dos papéis definidos de cada uma das três personagens. Acho que este texto daria um curta belíssimo. Um curta só com narração e cenas/imagens.
Há muita força nele, muito caos nas cenas descritas contrapondo-se com uma nostálgica narradora/observadora.
Muito bom, mesmo.
Bj,
S.
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